quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Salve Geral

Por Matheus Miguens



É preciso falar de Salve Geral.

Fui convidado para a sua glamurosa pré-estréia no cinema há um mês, com direito a famosinhos globais, craques do cinema brasileiro e claro, a imprensa. A expectativa era grande, já que o longa estreou com a chancela de ter acabado de ser eleito o candidato do Brasil para disputar uma das cinco vagas para o Oscar 2010 na categoria melhor filme estrangeiro. Porém confesso que, ao contrário do big-evento, não vi lá tanta coisa na telona.

No novo projeto, Sérgio Resende repete o feito de Zuzu Angel, ao abordar o drama de uma mãe em desespero, lutando pela vida do filho. Baseado em fatos reais, Salve Geral se passa em maio de 2006, quando a cidade de São Paulo ficou sitiada com os ataques liderados pelo PCC (Primeiro Comando da Capital). No meio do caos a viúva Lúcia, uma mulher simples de classe média, tem a missão de tirar o filho adolescente da cadeia. Em sua luta, Lúcia acaba se envolvendo com integrantes do Partido. Paralelamente, a facção criminosa vive uma acirrada luta interna de poder e ao mesmo tempo enfrenta o inimigo comum: o sistema penitenciário.

É um complexo drama, constituído em diferentes camadas. Seu roteiro é bem resolvido quanto à abordagem de diversas tramas paralelas, o que nem sempre é fácil. Não há heróis nem vilões; não trata policiais como malvados e nem presos como bonzinhos, o que é bom, já que o patético Última Parada 174, do mesmo gênero, resolveu transformar um moleque delinqüente num mártir (não há palavra melhor) da sociedade. Abrindo um parênteses: veja bem, não me considero um Dândi aburguesado e ignorante das mazelas sociais, só acho que o bom senso deveria ser valorizado na crítica ao comportamento humano. Policiais, bandidos e cidadãos: todos agem de forma violenta, de acordo com os interesses. É um fato. A questão social é complexa, e está acima de preferências individuais, o que deveria ser óbvio. Todos somos, num só tempo, vítimas e culpados, agente e reagente, ativos e passivos. Somos todos corruptos, essa é a realidade. Ok, mas sem fugir da crítica à sétima arte, continuemos. Enfim, o filme apresenta esse panorama para mostrar mais uma vez o sistema carcerário falido que o Brasil tem, a violência policial e a corrupção em todas as escalas. Mesmo sem apresentar esses elementos de forma clara, é contado sem perder o ritmo, integrando todas as histórias de forma limpa.

Salve Geral é correto quanto à recriação do fatídico domingo em que São Paulo parou. Mas o longa sempre parece menos convincente em sua porção fictícia, ao se apoiar em personagens cujas ações e reações não parecem lógicas. Vide a idéia da humanização da estória. Se a idéia do diretor era aproximar o expectador do filme ao colocar uma pessoa comum como protagonista, seu plano naufraga no momento em que a personagem se apaixona por um presidiário bonitão. Ta aí um lugar comum hollywoodiano. Válido também para a desnecessária cena da perseguição de carro à la Velozes e Furiosos, que destoa do filme – total clichê de Sessão da Tarde. Além disso, falta a naturalidade das ruas. As cenas são recheadas de frases de efeito que são declamadas como se estivéssemos todos no teatro. Isso parece se dever aos mais de 60 atores do cenário teatral paulista que integram o elenco. Talvez. Até porque, justiça seja feita, os atores são bons. Andrea Beltrão, por exemplo, é muito competente e não deixa a desejar. Porém, é a coadjuvante Denise Weinberg quem rouba literalmente a cena.

Apesar de a receita não funcionar, o Brasil insiste em enviar, ano após ano, o mesmo estilo de filme para o Oscar. Carandiru, Última Parada 174 e até o genial Cidade de Deus fracassaram. O que nos faz pensar que Salve Geral será diferente? É uma obra competente, mas sem potencial para comover os conservadores membros da Academia. Temo que nem seja indicado ao prêmio. E o mais curioso é que na mesma lista para concorrer à vaga, estava o filme de Selton Mello, Feliz Natal. E perdeu.

Mais nada a dizer. É esperar pra ver.


2 comentários:

Anônimo disse...

matheus,

sou seu fã.
sua análise tá tão bem construída. nem sei se concordaria com você, pois não vi o filme; mas o teu texto já vai me influenciar muito pelo sua consistência argumentativa e pelo seu estilo boladón.

sério, muito bom.

Garcia disse...

Infelizmente não posso opinar pois ainda não assisti o filme. De toda forma, gostei do seu espirito crítico. Estando de acordo ou não, sempre há de se respeitar uma defesa de opinião bem fundamentada.
Gostei do espaço que fizeram! Parabéns!
Um grande abraço!
Vithug

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